Priscilla Thompson
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Chega uma fase na vida em que a gente pode olhar para tudo o que construiu e ver o futuro com tranquilidade suficiente para aproveitar as conquistas com sabedoria. A crise da meia idade fica mais distante à medida que a ciência tem comprovado que aos 40 anos reunimos todas as condições para tirarmos o melhor das experiências vividas. Do ponto de vista neurológico, nosso cérebro está no auge da maturidade. À luz da psicologia, o repertório adquirido até então é o ideal para desencadear mudanças e reflexões necessárias ao equilíbrio emocional e afetivo.
Em quatro décadas, a maioria de nós já cumpriu as principais tarefas sociais, como casar, ter filhos e consolidar a carreira profissional. "É como se nos preparássemos para uma segunda etapa da vida, que não é o início do fim, mas do recomeço. Passamos a dar mais importância para o que realmente importa", resume a psicóloga e gerontóloga do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, Dorly Kamkhagi.
As conexões cerebrais são tão rápidas quanto na juventude e ganham um aliado a mais. "Quanto mais vivência e estímulos, como a leitura, melhor o cérebro fica. A capacidade de raciocínio aprofundado diante de situações diversas se amplia. As perdas de memória, ao contrário do que se pensa, só começam a ser sentidas a partir dos 60 anos", diz o neurologista Ricardo Afonso Teixeira, diretor do Instituto do Cérebro de Brasília.
Mais reflexivos
Mais tranquilos, experientes e seguros, deixamos de temer os fantasmas da solidão e da rejeição. Ainda que o corpo físico não responda com tanta rapidez às demandas do dia a dia, os ganhos produtivos podem ser maiores, graças à ajuda do cérebro. Aprendemos a nos abrir para novas experiências e a dar mais importância à reflexão. A impulsividade perde lugar para as decisões amadurecidas e acertadas.
Sem crises
Pode parecer contraditório dizer que o melhor da vida virá quando o que mais se comenta sobre esse período é a chegada da crise da meia idade. Mas essa crise tende a ser, justamente, um marco.
"Quando o corpo começa a entrar no processo de envelhecimento, temos a chance de olharmos para dentro. Se a crise vier, tende a ser extremamente produtiva, porque nos ajuda a evoluir", defende a psicóloga e especialista em Felicidade Angelita Scárdua.
Portanto nada de desespero. Aproveite para se dar o direito de recusar convites para reuniões chatas de amigos, para planejar aquela viagem sem os filhos adolescentes e para colocar em prática tudo aquilo que até então ficou na "geladeira" à espera do tempo certo. Ele começa agora.
"Eu me sinto no ponto de equilíbrio da minha vida", diz o policial militar Leonardo Alves Pinheiro, que chegou aos 40 pronto para aproveitar o que conquistou. De família humilde, de São Gabriel da Palha, ele chegou a Vitória aos 18 anos, sozinho. Hoje, no apartamento de frente para o mar, em Vila Velha, aproveita a maturidade. "Aprendi a curtir a minha família e a me dar o direito de viajar pelo menos duas vezes por ano", diz. E completa: "Hoje, me sinto seguro para mudar o que ainda tiver que ser mudado, sei dizer ?não? aos meus filhos com tranquilidade, quando é preciso, e encaro a vida com mais naturalidade. São coisas que só se ganha com o tempo", ensina.
"Aos 40, ainda temos lindos capítulos a serem escritos, de encontros e desencontros", Dorly Kamkhagi, psicóloga e gerontóloga da USP
A "idade da loba" não existe à toa. Livre dos conflitos que transformam o sexo em uma luta pela busca do prazer, as mulheres sabem chegar aos 40 anos donas de si e de seus desejos. É nessa fase que a maioria consegue despertar para a sexualidade de maneira mais intensa. "As coisas ficam mais prática e mais reais, e a mulher aprende a dizer não quando não quer sexo, a dizer sim quando só quer sexo e a vivenciar o prazer na relação", explica a diretora do Instituto Paulista de Sexualidade, Carla Zeglio.
Na contramão do sexo bem resolvido estão a queda da produção hormonal, que provoca, na maioria das mulheres, a queda também da libido. "Mas o desejo e o pensamento superam tudo. Se a mulher está bem consigo, não há hormônio a menos que atrapalhe uma boa relação afetiva", destaca.
Com o homem, a libertação acontece de forma parecida. "Eles também aprendem a priorizar o desejo ao ato sexual pura e simplesmente e a respeitar mais os desejos da sua parceira. O sexo na maturidade tende a ser muito melhor", afirma.
Hora de realizar sonhos
Prestes a completar 40 anos, em setembro, a servidora pública Kátia Cristina Galvão sente que está entrando em uma década de ouro. Com o filho já adolescente, um emprego garantido e a tranquilidade de quem é dona do seu próprio nariz, ela planeja mais para o futuro. "Estou retomando, aos poucos, minha dedicação ao carnaval, que é uma paixão, e quero desenvolver projetos sociais no bairro onde moro, em Jucutuquara. Já superei muitas dificuldades e sei que tudo na minha vida vai ser melhor a partir de agora", conta. Autora de sambas-enredo e presença certa nos desfiles das escolas de samba de Vitória, nos últimos anos ela voltou a acompanhar, inclusive, os desfiles do carnaval do Rio de Janeiro. "É um presente que agora posso me dar", comemora.
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